Saturday, December 02, 2006

Crônica

As palavras são bonitas. Mas tudo isso aqui é emprestado mesmo... já fiz uma e farei outra, em breve. Muito breve... arte no corpo emprestado, arte com significado, arte para mostrar algum momento que acaba sendo eterno no corpo e às vezes na alma.
Enjoy it!
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Tatuagem

10/04/2003 14:13:51

1. Não vou fazer uma tatuagem porque me assusta a promessa de permanência sobre a pele; porque não ouso desafiar o transitório; porque, como o poeta já explicou, Ninguém sonha duas vezes o mesmo sonho, Ninguém se banha duas vezes no mesmo rio, Nem ama duas vezes a mesma mulher; porque não guardarei o definitivo na geografia de mim mesmo.

2. Não vou fazer uma tatuagem pelo mesmo motivo que leva um cardeal a não disputar um rally; ou um peão de boiadeiro a não escrever um ensaio sobre T. S. Eliot; ou um alcagüete da polícia a não freqüentar a São Paulo Fashion Week; ou um jornalista freqüentador do Bar Brasil a não pedir água mineral na Quinta Sem-Lei; ou uma alta executiva da indústria de cosméticos a não comer um ovo cozido num boteco da zona norte; ou um cronista a não fazer uma tatuagem.

3. Não vou fazer uma tatuagem porque, quando eu trabalhava no jornal "O Popular", a redação ficava ao lado da sala de um tatuador. Numa tarde, eu fechava a edição quando chegou uma garota. Ela perguntou: "Aqui é o tattoo?" Respondi: "Não, o tatu é o vizinho".

4. Não vou fazer uma tatuagem porque não sei como ficaria. Muitos amigos e amigas fizeram. Há tatuagens legais – que lembram o Sol, a saúde, a energia, a paixão e a vida. Há tatuagens que lembram os elementos e os enigmas. Há tatuagens com ideogramas de gratidão e símbolos de lealdade. Há tatuagens que abraçam a bela garota, envolventes como a passagem do tempo. Mas também conheço tatuagens que lembram os campos de extermínio, o sangue derramado e a guerra.

5. Por falar em guerra, não vou fazer uma tatuagem por razões de protesto. Porque não quero ver a próxima batalha, o próximo Iraque, a próxima Badgá. Sei lá o que tem a minha não-tatuagem a ver com a sanha de Bush, mas fica registrado.

6. Não vou fazer uma tatuagem porque já a faço todos os dias, quando escrevo. Todo texto é uma tatuagem sobre o papel. Há cinco anos, eu era ateu; hoje acredito em Deus. Há cinco anos, eu era trotskista; hoje não acredito em revolução. O que fazer dos meus textos ateus e comunistas? Apagá-los? Nunca. São as minhas tatuagens na pele de papel.

7. E, finalmente, não vou fazer tatuagem porque a única tatuagem possível não mora na pele, nem no papel. A única tatuagem possível é a que nos aproxima da eternidade. O nosso vínculo com o absoluto. É o que realmente fica de nós, em nós. E o nome dessa tatuagem, meus amigos, é amor.

[Paulo Briguett]

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Música para ouvir: She will be loved - Marron 5

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1 comment:

/ʌksʊkʌrʌ/ said...

não vou fazer tatuagem porque a minha tauagem é "indesenhavel", é intransferível, é intrínseca, é inesgotável, é "Alexível".
A tatuagem tem a ver com a evolução do homem e do desenvolvimento da consciência do "eu" dele.
Os homens das cavernas se orgulhavam das cicatrizes que conseguiam nas caças, pois elas eram sinônimo de coragem. As tatuagens eram usadas para marcar os momentos da vida biológica (nascimento, adolescência...), registrar os fatos da vida social (tornar-se guerreiro, sacerdote, casar-se...) e pedir proteção ao sobrenatural.
Legal né???